Pierre Rosa

5 LIÇÕES QUE APRENDI COM O CURITIBA COMEDY CLUB – CCC

Tempo de leitura: 21 minutos

No dia 19 de Setembro de 2020, nós comediantes ficamos sem teto, essa é a data do fechamento do CCC – Curitiba Comedy Club.  

Se você está pensando: E daí? Eu nunca me apresentei lá. Nunca me chamaram. Nunca me deram a chance. Então eu te digo: Continue lendo somente se você estiver aberto a entender a realidade do negócio Clube de Comédia e saber que eles, o CCC, não tinha nada contra você. ( Agora, se você de alguma forma teve algum problema com a administração da casa, aí é outro assunto. 🙂 

O último show foi feito pelo Emerson Ceará com participação do Eduardo Jericó. Acertadíssima escolha!

O CCC fechou por causa dos problemas financeiros causados pela pandemia do COVID-19. Outros clubes de comédia também fecharam pelo mesmo motivo. Eu escrevo a respeito do CCC porque pra mim era o melhor que já estive. E você vai saber o porque durante esse artigo.

Mas vamos lá!

As 5 lições que eu aprendi com CCC.

Pierre Rosa no palco do Curitiba Comedy Club
1º vez no palco do CCC – 19 de Agosto de 2011

#1 – DONO DE CLUBE DE COMÉDIA NÃO É COMEDIANTE É EMPRESÁRIO.

Por mais que pareça óbvio essa afirmação, por algumas vezes eu fiquei chateado com o Giuliano até que eu entendi o que acontecia.

Giuliano é um dos donos do CCC junto com seu irmão Joca, sua mãe dona Rose e sua irmã Lorena. 

Minha primeira apresentação no CCC aconteceu em 19 de Agosto de 2011 com meu grupo Louco é Pouco. Na época éramos eu, Eduardo Jericó e Nizo Neto. 

Depois desse dia me apresentei pelo menos uma vez por ano no CCC. E é ai que começou meu aprendizado.

Em 2011 a comédia stand-up esta em crescimento vertiginoso no Brasil. Muitos comediantes surgindo e como nessa época eu já tinha experiência no estilo eu conseguia negociar apresentações do meu show solo mesmo sem ter um nome conhecido.

No dia 23 de Julho de 2012 eu fiz meu primeiro solo no CCC e foi quando comecei a conhecer melhor os donos do CCC. 

Na época eu tinha noites com shows no Rio de Janeiro, então conversávamos sobre diversos assuntos e os desafios de produção de shows de stand-up tanto no Rio quanto em Curitiba era um tema recorrente. 

Eu jamais imaginaria que o primeiro clube de comédia do Brasil tinha que trabalhar duro para convencer as pessoas a irem aos shows. Na minha cabeça era coisa fácil de fazer.

Eu via as fotos dos shows de comediantes conhecidos e estava sempre cheio, então eu pensava: “Tão com o bolso cheio de grana. “ Mas a casa cheia era em 1 ou 2 dias da semana. E os outros 5 ou 6 dias? A casa abria, tinha gastos, precisava faturar e como fazer?

Tive vários papos sobre esse como fazer para trazer o público para o CCC. Curitiba de acordo com o IBGE tem 1.948.626 de pessoas em 2020. Se começar a filtrar quantas dessas pessoas têm o costume de sair para lugares como teatros e clubes de comédia o número final é bem baixo e se colocar ainda a concorrência que existe em Curitiba de shows de comédia, o pessoal do CCC tinha muito trabalho. 

A medida que os anos foram passando novos comediantes foram surgindo. Novos e bons comediantes, principalmente de Curitiba, começaram a ocupar a agenda do CCC. E como o Giuliano falava: É impossível acertar a agenda para que todos possam se apresentar nas sextas ou sábados. ( Ele fala isso, só não sei se com essas palavras. ) 

Cada vez que eu ligava para pedir uma data para apresentar era sempre muito tempo a frente ou as vezes nem tinha data. 

Por algumas vezes eu fiquei chateado mas depois eu tive que entender que os caras tinham que faturar. Eles têm contas de consumo para pagar, salários e afins. 

Todas as vezes que eu me apresentei a casa estava sempre perto ou um pouco mais de 50% de ocupação. Isso quer dizer que eu não levava público. As pessoas iam para assistir ao comediante que estivesse na noite não a mim. Por mais que que os caras gostassem de mim e eu deles o caixa não fechava no final.

Esse tipo de situação vez com que eu aprendesse a entender o lado do empresário. Eles tem que faturar. 

Mas e eu com isso?

Como eu disse. No início eu fazia show solos aos Sábados. Depois passou para as Sextas. Mas com passar do tempo os Sábados e as Sextas estavam preenchidos com os nomes mais conhecidos, nomes que levavam grandes públicos. Então eu me vi com 2 opções.

  • Opção 1: Ficar puto com o Giuliano e o Joca, pois eu achava que eles deveriam me contratar para fazer um show pois mesmo eu não sendo famoso ou conhecido eu entrego um show de excelente qualidade. E eles não me contratarem era uma falta de respeito comigo que os conhecia a anos. 
  • Opção 2: Perguntar qual seria um dia legal para que valesse à pena para eles investirem em me levar para fazer show no CCC. Pois eu queria muito apresentar na casa.

Acho que dá pra saber qual opção eu escolhi!

Nas diversas conversas que eu tive com eles, além da minha vivência na prática eu posso afirmar que trabalhar com artistas é complicado porque muitos têm dificuldades de entender o negócio por trás da arte. Há grande objeção em desvincular o sentimento dos números. O sucesso de um negócio é medido por números e somente por números. O sucesso de um artista tem diversas variáveis a serem consideradas. 

A vantagem de entender esse raciocínio é que evita o meu lado artístico de ser facilmente ofendido. Ou melhor, de se sentir ofendido. Meu querido e inseparável ego.

Fio uma época que eu comecei a procurar entender meu valor no mercado. E quando eu digo valor eu quero dizer números. O quão rentável é para um contratante contratar meu show. Com esse entendimento em mente ficou mais fácil negociar e mesmo administrar minha carreira e meu ego.

1º show do Louco é Pouco nesse formato – 06 de Outubro de 2012

#2 – PARA O PÚBLICO A PIADA OU ESQUETE E SEMPRE NOVA

Eu digo isso porque por muitas vezes fazemos as mesmas piadas por anos. Ou apresentamos os mesmo esquetes. Chega um momento que dizemos: não tenho mais saco pra fazer essa piada ou esquete. Já perdeu a graça!

Esse história foi protagonizada pela dona Rose. 

Jericó – Rose – Pierre

Pois bem.

Em 2006 eu tinha um show em São Paulo chamado Ke Vim Vem. Foi bem a época que surgiu o Youtube. E pra você que não sabe o vídeo que era o viral na época era uma esquete chamada Evolução da Dança. Uma esquete cômica de dança que fazia uma viagem no tempo através da música e dança. Aqui o link.

Eu fiz uma versão onde coloquei músicas nacionais. Por anos esse número fechou os shows que eu fazia tanto solo como em grupo. Eu gosto muito desse número tanto que faço até hoje se for preciso. O negócio é que se eu atualizar as músicas vai ficar com 10 minutos ou mais. Assim é bom que me mantenho em forma.

Mas deixa eu voltar ao CCC.

No meu primero show solo no CCC, no dia 23 de Julho de 2012, eu apresentei esse número. Lembro que todo mundo curtiu muito porque não é muito comum ver comediantes de stand-up fazendo esquetes. Só que esqueci de falar que pela cronologia da minha vida primeiro eu sou palhaço. E isso pra mim é muito importante. Mas isso é outro papo.

No dia 8 de Outubro de 2012 voltei ao CCC, só que dessa vez com o show Louco é Pouco junto com o Eduardo Jericó. A esquete da dança fazia parte desse show também só que dessa vez o Jericó dizia que dançava. hahahahahhaa

Em 2013 foram 2 shows com o Louco é Pouco, 21 de Julho e 14 de Dezembro, e mais uma vez estavamos dançando.

Ou seja, eu não aguentavaaaaaaaa mais apresentar essa esquete. 

Em 2014 eu fiz uma apresentação solo e como de costume fiz minha apresentação e terminei com outro esquete que tenho chamado Bixiga. 

Quando eu estava agradecendo a atenção da platéia eu ouço pelo sistema de som a dona Rose pedindo pra eu fazer o número da dança e sem tempo de eu responder a música começou…e lá estava eu dançando outra vez.

A platéia se amarrou.

Depois no camarim a dona Rose disse que tinha gostado muito do meu show mas que ela queria mesmo era ver a dança. E como a música estava no computador do CCC ela pediu pra colocar.

O Giuliano ficou sem jeito porque achou que ela não era pra ter interferido no roteiro do meu show. 

Mas nada melhor para um palhaço que ter seu show interrompido para pedirem um número seu. É como um músico que ouve a platéia pedir uma música. No caso de palhaços isso não é muito comum. 

#3 – A IMPORTÂNCIA DO ENSAIO

12 de Junho de 2013 – Show do dias dos namorados no CCC e lá estava eu com meu solo!

Nesse dia estava um frio de lascar em Curitiba. Cheguei cedo em fui para o hotel. Até o momento de eu ir para o CCC eu não tinha nada pra fazer. Foi então que eu tive uma ideia. Vou ensaiar todo o o show.

Nessa época eu estava lendo diversos livro da minha época do curso de Artes Cênicas. Naquele momento eu lia o livro Medéia de Eurípedes. Na época da escola quando eu lia esses livros eu fica de sacanagem em casa ensaiando esses textos para treinar memorização, dicção e afins como se eu estivesse em um novela mexicana.

Então enquanto eu lia Média no hotel eu resolvi ensaiar as minhas piadas como se fosse um novela mexicana.

Lembro claramente de escrever todas as piadas em folhas que eu consegui na recepção. Acho que fiquei umas 3 horas ensaiando piadas que já fazia a mais de 2 anos.

  • Resultado 1: Durante o ensaio criei piadas novas, como ensaiei muito na hora da apresentação as piadas sairam naturalmente. 
  • Resultado 2: A minha apresentação foi memorável. As piadas fluíram como deviam. As pessoas riam quando tinham que rir. Foi sensacional.

Curiosidade sobre esse show

Esse show foi especial dia dos namorados.

O valor da entrada era algo tipo R$200. Isso porque esse era o preço do casal + jantar + show. Isso quer dizer que se dividir por duas pessoas fica R$100. R$50 pro jantar R$50 pra mim. hahahahahahha

Nesse dia teve a primeira apresentação de garçons cantantes. Foi muito legal. Eu não sei por quanto tempo se manteve essas apresentações mas eram bem legais.

Moral da história: nesse dia eu tive a confirmação de algo que eu já sabia na teoria mas nunca tinha praticado com o afinco necessário para ter bom resultado.  Depois desse dia já perdi as contas de quantas vezes já ensaiei antes de shows. E sempre…sempre….sempre…. o show é bom, no que tange a minha apresentação.

#4 – AMIGOS / COLEGAS

Por muitas vezes durante a vida eu ouvi falarem que amigo de verdade a gente faz somente quando é criança. 

Eu digo que a pessoa que falou isso teve muito azar na vida.

Através da comédia stand-up eu conheci um amigo que virou d`aquales irmãos que a gente escolhe que é o Eduardo Jericó. Não vou falar nada sobre ele porque é capaz dele começar a chorar e ai já viu… hahahahahha

Outro grande amigo que fiz em Curitiba foi o Fagner Zadra. 

Em 2012, quando fui fazer meu primeiro show solo no CCC eu entrei em contato com um grupo que também apresentava na Cia dos Palhaços. E assim eu conheci o Fagner. 

Também não vou falar sobre o Fagner porque o Jericó ficaria com ciúmes e o Fagner iria sacanear o Jericó e assim o Jericó iria chorar….

Cia dos Palhaço e CCC

E através da comédia conheci outros comediantes de Curitiba que não tenho uma grande amizade mas tenho admiração pelo trabalho e sei que são pessoas legais.

Dentro do CCC eu sei de vários comediantes que ficaram amigos, criaram shows juntos, também brigaram e depois se entenderam.

Meu ponto aqui é….um clube de comédia, para nós comediantes, vai muito além do que apenas um lugar para se apresentar. 

Um clube de comédia é o lugar de aprendizado para todos profissionais da comédia. 

E isso o CCC pode muito ajudar.

#5 – ACESSIBILIDADE

Atualmente no Rio de Janeiro eu tenho o Porão da Comédia. Um show de comédia stand-up que virou um clube de comédia, ou pelo menos nós tentamos fazer com que se torne.

Desde a primeira vez que eu conheci os donos do CCC meu contato com eles sempre foi direto. Nunca teve frescuras para falar com ninguém lá. Eu queria algo deles eu ligava, ou mandava mensagem. E eles sempre me respondiam.

Com o passar do tempo comecei a indicar colegas que queriam se apresentar no CCC mas não entravam em contato porque achavam que iriam ser tratados da mesma forma que outro clube de comédia nos tratava. 

Então para provar que não era nada, mas nada igual, eu mesmo ligava para o Giuliano e avisa que um colega iria entrar em contato.

Alguns colegas ligaram e alguns chegaram a apresentar.

Com alguns não teve continuidade a parceria mas nesse ponto eu já não tinha mais como ajudar. 🙂

Eu lembro um ano que levei uns 4 meses para conseguir fechar uma data para me apresentar no CCC. Foram 4 meses de conversas com o Giuliano e consegui marcar a data para 4 meses a frente. 

O que eu acho interessante destacar nessa história é que tanto eu mandava mensagem para pedir a data quanto o Giuliano mandava mensagem lembrando que eu era pra ter escolhido uma das opções que ele tinha me dado. 

E é isso que eu sempre quero manter com qualquer show que eu produza. Eu quero sempre estar acessível a qualquer pessoa que queira mostrar sua comédia no meu palco e sempre irei tratar com respeito tanto um comediante experiente quanto um novato. Porque eu sei na pele como é ser tratado com desrespeito por parte de produções de clubes de comédia e isso eu não quero pra ninguém.

Abaixo é um papo que tive com o Giuliano com mais de 30 minutos que está dentro do meu treinamento de comédia o Torne-se Profissional da Comédia.

Nós conversamos sobre tudo ou quase tudo que ele acha que é necessário para comediantes novos e experientes fazerem no mercado.

#BONUS – AFONSO PADILHA

Sabe aquelas histórias que a gente as vezes ouve: …e ai do nada o cara agora tá ai, maior sucesso! 

Não lembro bem em que ano foi isso mas teve uma vez que eu estava em Curitiba para um show corporativo e passei no CCC. Naquela noite tinha show do Afonso Padilha e o Emerson Ceará. 

Quando eu cheguei eu não fui até o camarim falar com o pessoal, assisti ao show e depois falei com os comediantes. Os 2 arrebentaram!

Quando o show terminou ficamos na mesa conversando e comendo. Foi então que o Afonso falou que tinha que ir embora pois precisava escrever. Eu perguntei: escrever pra que? Ele disse que tinha que escrever piadas e não eram piadas para algum trabalho e sim piadas para ele fazer em outro show. Não lembro exatamente as palavras certas mas o que me chamou a atenção foi o foco do moleque em desenvolver sua criação de piadas. Pelo jeito o resultado foi positivo desse esforço!

Eu vi na vida real as coisas que eu lia em livros. Escreva o máximo que puder. Marque hora para escrever. Siga sua estratégia.

Na verdade eu nunca soube se ele tinha ou tem estratégia para exercitar a escrita e criação de piadas mas observando o rumo que teve sua carreira devido a qualidade da sua comédia acredito que deu certo o que ele planejou até o momento!

Resolvi escrever sobre isso porque acho válido ressaltar a importância de trabalhar com dedicação e levar muito a sério a comédia.

Eu poderia escrever mais e mais sobre o CCC pois é um lugar que gosto muito. Na verdade, depois de reler o que eu escrevi eu percebi que o que eu gosto mesmo não é o lugar e sim as pessoas que lá conheci.

Tem pessoas que eu não citei muito porque viraria um livro esse artigo. 

Assim como outros comediantes que vi se manifestarem nas redes socias, eu também tenho certeza absoluta que a dona Rose, o Joca, O Giuliano e a Lorena irão reabri o CCC de alguma forma. 

Eu registro esses meus pensamentos e sentimentos aqui como uma pequena forma de homenagem a essa galera que fez tanto por mim e por outros profissionais da comédia. 

Uma homenagem como forma de dizer MUITO OBRIGADO!

MUITO OBRIGADO MESMO.

E Giuliano, se você ler esse artigo, por favor, já marca uma data pra mim no próximo CCC.

Grande beijo a todos.

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Pierre

09 de Junho de 2017

tá bom, tá bom… se tem uma imagem que está marcada na minha memória do ccc é essa abaixo.

nojento

5 LIÇÕES QUE APRENDI COM O CURITIBA COMEDY CLUB – CCC

5 comentários em “5 LIÇÕES QUE APRENDI COM O CURITIBA COMEDY CLUB – CCC”

  1. Muito bom o artigo. Vale a pena ler. É um bom aprendizado. O artigo tem informações essenciais para quem deseja fazer humor.

  2. Evelyn Mayer

    Ah, que texto massa! É isso aí, Pierre! Obrigada por compartilhar. =)

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